O Destino de cada passo por Helena Gerenstadt - gerenstadt@terra.com.br

ocê alguma vez já trabalhou num grande projeto ou tarefa, em casa, no trabalho ou lazer, um projeto que o absorveu por inteiro e que sempre estava em sua mente, algo que era a sua vida, a sua realização pessoal e a razão de você levantar-se a cada manhã? Quando o projeto foi concretizado, o objetivo atingido, sentiu-se você vazio ou insatisfeito? Ficou se perguntando com desânimo: é isso mesmo, é só isso?
Durante os esforços empreendidos, o objetivo era realizar a tarefa, alcançar a meta, de cuja consecução você esperava ter a absorvente sensação de alívio e conquista.
Ao invés disso, sentiu-se desapontado, desiludido e enganado. E então você ficou se perguntando se valeu a pena gastar tanto tempo e esforço.
O que saiu errado?
É possível que estejamos confundindo a jornada com o destino, os esforços e o resultado culminante, o processo e o produto final. Ao darmos demasiada importância ao objetivo, tendemos a esquecer ou deixar passar despercebida a importância intrínseca da jornada. Como resultado, ficamos nos perguntando se o sucesso é uma grande ilusão, e a meta um prêmio quimérico.
Com que freqüência dizemos "quando eu conseguir esse cargo, serei feliz", ou "quando me formar... ou talvez quando eu tiver a casa de meus sonhos..."
Ao conseguirmos a promoção, recebermos o diploma ou construirmos a casa, ficamos satisfeitos? Provavelmente não!
A preocupação com o destino nos faz menosprezar o valor da caminhada e sua capacidade de aprimorar nosso caráter. A caminhada é muito importante, pois é nela que a vitória é alcançada e a felicidade é conseguida ou perdida. É garimpando que encontramos as pepitas da recompensa.
Que existe no cume de uma montanha que não possa ser encontrado no vale, que não seja encontrado a cada passo da jornada? Lembramos um aforismo: "Não conquistamos uma montanha. Ficamos alguns instantes no cume; então, o vento apaga nossas pegadas". Se a conquista do cume é transitória, algo que passa, deverá haver grande valor na caminhada ou ascensão ao cume. O final é somente uma pequena parte de uma peça musical, o epílogo somente uma fração de um livro, o destino somente um passo da caminhada.
Um antigo provérbio chinês diz: "Uma jornada de mil quilômetros começa com um único passo". A jornada começa com o primeiro passo, e o primeiro passo é todo passo da caminhada. É comum deixarmos de caminhar quando o destino é tudo o que buscamos e o objetivo parece distante demais. A caminhada começa, progride e termina a cada pequeno passo. Não fracassamos; antes, deixamos de tentar, quando nada temos por que lutar, se não por um objetivo distante, quase invisível.
A preocupação com o fim nos faz esquecer a excitação, o desafio e a importância do primeiro passo, da primeira dúvida, da primeira descoberta. É a excitação da possibilidade que estimula o espírito humano, e é acesa pela força da caminhada. Não podemos dar prosseguimento sem termos começado.
"Sou um idealista", escreve o poeta Carl Sandburg,"Não sei aonde estou indo, mas estou caminhando". Às vezes basta que caminhemos, mesmo que o caminho não seja muito claro. A expectativa e a excitação do progresso nos mantêm caminhando, mas é preciso uma centelha para acender a chama. Nas palavras do filósofo krishnamurti: "O primeiro passo é o único passo".
O ex-Secretário Geral das Nações Unidas, Dag Hammarskjold, escreveu certa vez: "A jornada mais longa é a que faz para dentro de si aquele que escolheu seu destino, que começou a buscar a fonte de seu ser". A jornada - qualquer jornada, qualquer projeto - é uma jornada rumo à tomada de consciência do Ser, e ela está repleta de armadilhas, obstáculos e resistência. A busca de autovalorização e autocompreensão é dolorosa mas necessária. Faz parte do processo de nos tornarmos uma personalidade integrada, total.
Cada projeto, cada processo, cada esforço é um passo na direção do interior -um salto para as profundezas da personalidade individual, um fio a mais entrelaçado no tecido de um ser humano. Quando finda uma particular jornada, nessa mesma medida, conhecemos mais sobre nossas possibilidades e limitações, nossas capacidades e incapacidades, e ficamos ansiosos para ir com ímpeto mais adiante, ansiosos por conhecer mais.
O finado Peter Boardman, destacado alpinista britânico, em seu livro A montanha Cintilante (The Shining Mountain), escreveu: "As fronteiras de hoje não são de terras prometidas, de precipícios ainda não atravessados e de misteriosos vales além. Somente o Ser interior do alpinista continua sem mapa".
A jornada é uma tentativa de escalar do espírito do montanhista, de ascender ao cume do conhecimento interior, e essa pode ser uma jornada solitária. Geralmente as pessoas são insensíveis e intolerantes para com aqueles que enveredam por um caminho diferente do da multidão, que percorrem um caminho que se afasta da estrada comum. A pergunta que normalmente se fazem é: "Aonde levará este caminho? Parece que a lugar nenhum". O que não percebem é que cada passo está levando a algum lugar, cada movimento faz parte de "chegar lá". Iniciada a jornada, a meta é ir com resolução adiante.
Como o protagonista do romance de Herman Hesse, a maioria de nós chega a compreender que a jornada nunca tem fim; que caminhar é viver, é um modo de vida. A jornada é um processo de tornar-se - não uma única investida a um único objetivo ou a uma única montanha. Embora a jornada nunca termine realmente, às vezes nos leva de volta ao ponto de partida, com uma nova consciência ou uma compreensão mais profunda, fazendo-nos "conhecer pela primeira vez o local". Jamais conquistamos o cume duma montanha. Jamais conquistamos o Eu Interior. Buscamo-lo de novo a cada dia, a cada passo da caminhada.
Amanhã haverá um novo cume um novo despenhadeiro, uma nova jornada. E o novo objetivo pode ser um pouco mais árduo de alcançar, estar um pouco mais adiante, ser um pouco menos acessível. Mas o verdadeiro buscador sabe que, alcançado o objetivo, a jornada continua. Cada ponto de chegada é um ponto de partida de uma nova viagem. Cada capítulo terminado indica um novo capítulo ou um novo livro a ser começado. Não podemos ficar satisfeitos com o destino apenas. Não podemos repousar para sempre nos louros daquele grande projeto concretizado.
Nada disso, porém, denota que os objetivos e destinos são triviais. O cume é uma das razões de escalarmos uma montanha. Ele nos fornece uma nova visão, uma nova perspectiva. Se nosso objetivo não for o cume, não progrediremos muito na caminhada. O destino é a culminação da aventura, o pináculo do triunfo, o passo final da caminhada (e às vezes o mais difícil). Mas não precisamos nos sentir vazios, desapontados ou desiludidos quando findarmos o nosso projeto ou jornada atual - não se tivermos trabalhado arduamente durante a caminhada e tivermos aprendido as lições nela contidas.
O destino poderá se revelar suave, a conquista cristalina e o espírito do montanhista sentir-se vitorioso se compreender o propósito da jornada e o propósito do destino. E parte da recompensa de ter chegado tão longe.
Podemos escalar a montanha e olhar por sobre o abismo com certa satisfação. Podemos nos ocupar em refletir e determinar o curso do novo capítulo, porque o objetivo foi alcançado a cada passo da caminhada e sabemos que a caminhada terá novo início.
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